Amor, amigos, educação, igualdade, sonhos e tolerância são as palavras escritas em corações de papel ao lado esquerdo da porta de entrada da sala de recursos multifuncionais. Elas revelam sentimentos e compromissos de professores da Escola Estadual Tancredo Neves, na zona Sul de Porto Velho, que acolhe alunos com síndrome de Dow, deficiência intelectual, e autistas. Na celebração do Dia Internacional da Síndrome de Down, 21, a direção da escola que vem sendo considerada referência na inclusão promoveu uma live, com título:
“MunDOWN de Amor”, a fim de dar mais visibilidade ao assunto. A live homenageou alunos e ex-alunos especiais. Dona Marisa, mãe de Eduardo Miguel, 12 anos, e dona Glória, mãe de Paulo Henrique, 12, ambas moradoras do bairro Caladinho, agradeceram o cuidado com a rotina e do aprendizado deles. Os dois convivem entre 285 alunos matriculados no período da manhã.
MÃES PERSEVERANTES
“Eu agradeço por vocês existirem em nossas vidas”, disse Marisa. Em comovente depoimento, ela lembrou ter conhecido mulheres que foram abandonadas pelos maridos tão logo estes descobriam que elas gerariam downs. “Eles perderam a grande oportunidade de verem seus filhos independentes, pois fazem diversas atividades, separam suas roupas, tomam banho, e se vestem sozinhos, numa vida normal”, destacou. A partir do nascimento de Eduardo ela começou a estudar a respeito do assunto, e lamenta que a sociedade ainda tenha preconceito. “Sentimos isso desde quando ele teve acompanhamento na (Sociedade) Pestalozzi, para onde eu ia todos os dias, e dentro da família por parte do avós”. Ressalvou que a equipe da Pestalozzi sempre cuidou bem do filho, suprindo suas necessidades nos primeiros anos de vida. Aquela entidade dispõe de médicos, psicólogos e demais profissionais, e quando não havia médico, encaminhavam Eduardo para a Policlínica Oswaldo Cruz. Mesmo não tendo sopro no coração, algo comum entre crianças com a síndrome, Eduardo foi diagnosticado, em 2018, com epifisiólise (ocorre por uma alteração nas camadas de crescimento ósseo da cabeça do fêmur) e recebeu dois pinos no quadril. Já Paulo Henrique teve diagnóstico de pneumonia e sua mãe Glória deu o máximo de seu esforço para mantê-lo na escola, onde foi chamada várias vezes. Aberta aos desafios, a escola ouve as famílias dos alunos nessas condições e consegue mantê-los em forte parceria “na dor e na alegria” e trata esse assunto sem melindres intramuros ou externamente. Por essa razão, a professora Lene Reis prefere denominar a data: “Dia Internacional das Pessoas com Síndrome de Down”. Ela e a vice-diretora Lidiane Silva manifestam gratidão ao Governo do Estado, pelo apoio direto à inclusão. Além da criação de salas multifuncionais, esse apoio possibilita a capacitação de outras direções e equipes para promover a inclusão.
Lidiane Silva: pessoas precisam conhecer para não excluir
“DÁ CERTO, SIM”
Acolhimento, como acontece a inclusão, e evolução do aprendizado estiveram em pauta. “Passamos uma mensagem muito positiva, mostrando que a inclusão dá certo sim, quando ela é bem trabalhada, com empatia e responsabilidade, sempre apoiada pela equipe gestora da escola”, assinalou Lene Reis. Segundo disse, vem recebendo apoio para sua formação: “Quando preciso me ausentar da escola para estudar percebo que a inclusão começa aí, com esse olhar da equipe gestora e a participação e aceitação dos professores, tornando importante o acolhimento da equipe pedagógica e possibilitando receber esses alunos com o coração aberto”.
“CONHECER PARA INCLUIR”
O mesmo canal apresentará outra live em abril próximo, com a participação de professores de alunos autistas. No próximo dia 25, a professora Lene e a vice-diretora, Lidiane Silva farão intercâmbio de experiências e relatarão as delas à direção e aos professores da Escola Bela Vista, no bairro Conceição. “A realidade escolar precisa ser compartilhada”, elas propõem. O comprometimento e a certeza de que “o caminho é o conhecimento” move a escola, acredita o diretor Valnide Meireles. Entusiasmado com a concepção do projeto “Conhecer para incluir”, ele faz coro ao trabalho das professoras, cujo sentido é alcançado quando se conclui que um dos fatores que contribuem para exclusão é a falta de conhecimento das pessoas a respeito das deficiências. Meireles, Lidiane e Lene sabem atualmente que as pessoas têm capacidade para aprender, desde que disponham de estratégias e metodologias bem elaboradas. A Escola Tancredo Neves foi uma das primeiras da zona sul da Capital a obter apoio da Secretaria de Estado da Educação (Seduc) para adaptar uma sala ao multiuso. Outra escola acolhedora nessa região é a Vicente Salazar.
Sala multifuncional é frequentada duas vez por semana
COLHENDO FRUTOS
“O ano inteiro fazemos a formação de professores e agora, com 16 anos de trabalho na sala de recursos, estamos colhendo frutos, daí ser muito importante comemorar esta data simbólica [Dia Internacional da Síndrome de Down]: é possível mostrar para as pessoas que há dificuldades, mas é possível vencê-las”. O aluno especial frequenta a sala de aula comum, e no contraturno vai até a sala de recursos duas vezes por semana, onde participa de atividades de desenvolvimento sensorial e cognitivo. Para que haja inclusão, a professora dessa sala obtém a formação continuada nas salas comuns. “Nossa proposta de constante diálogo com os pais é uma das metas mais importantes”, enfatiza a vice-diretora Lidiane Silva, porto-velhense que estudou e cresceu nessa escola. “Aqui continuamos nossa missão e estamos sempre dispostos a fazer muito mais por eles”, ela conta satisfeita revelando que um jovem funcionário de supermercado foi o primeiro a se valer da sala de recursos. Além de possuir doutorado em psicologia, a diretora Lene Reis defendeu tese na sua formação em Língua Brasileira de Sinais (Libras) a respeito de crianças ouvintes, filhas de pais surdos (coda), inédito. Lidiane é graduada em Letras/Espanhol e Pedagogia, especialista em Gestão e Filologia, tem cursos de Formação AEE (Atendimento Educacional Especializado), Educação Especial, Autismo, Síndrome de Down e Deficiência Intelectual. Na quinta-feira passada, dia 17, Lene e Lidiane deram curso para a formação de professores da rede municipal na sede do Sindicato dos Trabalhadores em Educação no Estado de Rondônia (Sintero), visando a inclusão escolar. “Nosso papel é buscar que as crianças que cheguem à escola com alguma deficiência sejam autônomas e realizem os seus e os nossos sonhos”, disse Lidiane. “O gestor escolar deve sensibilizar a comunidade escolar para o processo de inclusão. Disposto a incluir no calendário de formação continuada um momento de estudos sobre o tema, ele pode planejar com o Conselho Escolar a adequação do espaço escolar para a melhor inclusão”, explicou. Conforme Lidiane, ao mesmo tempo o gestor conhecerá as crianças na missão de inclusão e manterá parcerias com o professor da sala de recursos. Mesmo quando alunos com deficiência vão cursar o Ensino Médio na Escola Estadual João Bento da Costa, continuam sendo atendidos pela sala de recursos. O fato de dar certo mantém a parceria voluntária.
O QUE É ► A síndrome de down é uma condição genética causada por um problema nos cromossomos. Normalmente, o ser humano possui 23 pares de cromossomos, que são os responsáveis por abrigar o nosso código genético. ► Nesses cromossomos há informações desde a cor da pele e do cabelo ao desenvolvimento mental e às características gerais que ditam a fisiologia de um indivíduo. ► A síndrome de down é caracterizada por uma diferenciação no número de cromossomos. O cromossomo de nº 21, ao invés de apresentar um par, apresenta três cromossomos, na chamada trissomia simples do cromossomo 21, apontada como causa da síndrome. ► Existem outras duas condições que podem causar essa síndrome, destaca-se a translocação cromossômica, quando o cromossomo 21 se apresenta grudado a um outro cromossomo, dando a impressão de ser um cromossomo extra; e o mosaicismo, quando o problema na divisão celular acontece depois da formação do embrião, mas nem todas as células acabam tendo a trissomia do cromossomo 21. ► A trissomia simples do cromossomo 21, a translocação cromossômica e o mosaicismo são apontados como diferentes tipos de síndrome de down, sendo que a maior parte das características apresentadas pelos portadores dessa condição são similares. De forma geral, o paciente com síndrome de down pode viver uma vida perfeitamente normal, desde que sejam feitas adaptações ao seu ritmo de aprendizado e a sua forma de ver o mundo.